quarta-feira, 28 de maio de 2008

Partida!

Ouvi dizer uma vez que a vida se traduz nos desafios a que nos propomos, mais do que aqueles que superamos. Não a considero uma máxima absoluta, mas é sem dúvida verdade (para mim) que cada novo obstáculo desperta em nós o processo para a sua resolução. Mesmo falhando a prossecução do objectivo, a experiência será sempre enriquecedora.

Hoje, parto para um tal desafio. Num país com uma esperança média de vida de 36 anos, 13 vezes o tamanho de Portugal, mas com sensivelmente a mesma população, da qual 4 a 5 milhões estão concentrados na capital. Uma capital que pulula de actividade, repleta de estrangeiros e que é considerada a cidade mais cara do mundo para expatriados. Um negócio completamente novo para mim.

E tudo o que deixamos para trás...

Chega a altura de me erguer ao desafio. Arrumam-se dúvidas na prateleira, encerram-se os preparativos. Principiam-se as despedidas temporárias. Palavras amáveis de onde menos se espera. E o aumento da expectativa, gradualmente ocupando o nosso estado de espírito. O corpo aumenta o estado de alerta, mas aumenta também a tensão, como se deliberadamente quisesse impedir contemplações ou reflexões. "Já foi tempo delas, agora é em frente", diz a voz interior.

O colibri faz um voo rápido e rasante, como é seu hábito, e muda mais uma vez de rumo e direcção. A partir de amanhã, o canto do colibri prossegue o seu rumo, a partir de Luanda.

Muito obrigado a todos os que mantêm este espaço vivo e aos que me têm enviado felicidades, e ainda aos que torceram por mim. Até já.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Para vós

Por motivos profissionais, tenho estado ausente deste espaço, que não está esquecido. Volto em breve com novidades fresquíssimas e munido de novas experiências pessoais e profissionais, que gosto de aqui explorar à luz de factores que usualmente não são equacionados.

A todos os que ainda passam por este espaço, independentemente de eu não ter podido visitar os vossos, os meus agradecimentos pela vossa paciência. Mas, como na vida, também na blogoesfera é necessário uma purga ocasional. Deste modo, destacam-se aqueles que efectivamente se revêem neste espaço (nem que seja pela contradição, o que muito prezo), daqueles que se sentiam moralmente obrigados a retribuir as visitas. Da minha parte, eu nunca me senti, e só visitei (e voltarei a visitar) espaços que me interessam.

Nos outros, como aprendi nos meus tempos de leviandade juvenil: "Só faz falta quem cá está!"

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Repetitive Strain Injury

RSI foi um acrónimo que me veio parar aos olhos enquanto navegava. Em português, a expressão foi primeiramente traduzida para Lesão por Esforço Repetitivo (LER), e ainda hoje se usa, embora muitas pessoas comecem a defender o uso da nomeclatura "Doenças Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho (DORT)" No Brasil, por exemplo, esta expressão veio substituir a primeira. Existe um site que aborda a questão com rigor sobre as implicações médicas e patológicas.

Mais importante do que o seu nome, e a palavra que forma reduzido a acrónimo, é o conceito. Poderemos retirar daqui um corolário de que fomos feitos para evitar a repetição? Profissionalmente, por exemplo, a maior parte das pessoas tende a odiar as tarefas repetitivas.

Somos insaciáveis na busca de coisas novas. Inventos, gadgets, piadas, gastronomias, sensações e sentimentos, fartamo-nos de tudo facilmente, embora a ritmos diferentes, e logo levantamos a cabeça do que nos absorvia, perscrutando o horizonte em busca de mais.

Obviamente, não resisito a traçar o paralelismo com as relações humanas. Desenvolveremos nós lesões por esforço repetitivo? Será esta uma patologia que nos proíbe de desfrutar uma relação monogâmica a 100%? Criaremos tendinites na hipófise, atrofias na língua, chegando a experimentar dor enquanto repetimos o mesmo sentimento, dia após dia? Serão as relações como um circuito eléctrico mal desenhado, com elevadas perdas de eficácia e sobreaquecimento, à medida que são usadas? Esta parece ser uma corrente muito em voga, hoje em dia. "Nada é para sempre.", "Foi bom enquanto durou.", "O que importa é que se divirtam.", são lugares-comuns cada vez mais comuns!

Poderíamos, então, conceber grupos de ajuda, isenções no IRS e lugares especiais de estacionamento para aqueles que sentissem o mesmo há muito tempo! Os meus pais, casados há 39 anos e apaixonados há mais, veriam esses anos incorporados no cálculo da sua reforma!

Contudo, eu não vejo essas lesões, neles e noutros. Ainda há várias excepções que não confirmam a regra, mas a desmentem. O cenário, idilicamente elaborado, acaba por ruir estrondosamente, na minha opinião, à luz de um pormenor essencial: Se as LER se aplicam às relações humanas, se nos fartamos tão velozmente, porque razão tantos procuram exactamente essa plenitude? E porque ninguém fica indiferente quando encontra alguém que de facto a encontrou?

Depois de destruir a minha própria teoria, chego à minha própria explicação. As LER acontecem devido à repetição prolongada e excessiva da mesma tarefa. E é aqui que os conceitos se baralham para muitos. O que a expressão significa, é que o egoísmo em querer experimentar tudo de uma vez, em não dar tempo ou espaço para mais nada, é que acaba por minar o futuro do relacionamento. Absorvidos em nós próprios, entregamo-nos a 110% a tudo o que seja o nosso objectivo imediato, esquecendo o óbvio.

Uma relação não é tudo... para perdurar, tem de ter um lugar cimeiro, mas não único nas nossas vidas. Tem de ser conciliada com tudo o resto que nos dá prazer (quase tudo, vá), com todas as nossas obrigações e deveres, com todos os nossos hobies e loucuras. Ou seja, dá trabalho!


... mas diz-se que vale a pena! Diz que sim...

quarta-feira, 16 de abril de 2008

O Porquê do Canto

Uma Estrellinha, mesmo antes de rebentar em supernova, lançou-me um repto (não confundir com recto, era uma Estrellinha decente!): desvendar aqui o porquê da existência do Canto do Colibri.

Quando escritas, as palavras ganham outra cor, outra dimensão, outra realidade. Tornam-se palpáveis, reais, transmitem calor, ferem, amparam, materializam-se por si próprias. E materializam os seus significados, dando-lhes substância. Com as palavras, podemos perscrutar o poço mais fundo e escuro - nós próprios! O Canto nasce da minha necessidade de me sondar, de me perceber. Como em todas as outras fases introspectivas da minha vida, voltei-me para as palavras e procurei usá-las como um guia para me (re)conhecer. Dado que este é um blog onde dou a cara (literalmente, ainda não arranjei maneira de terem de pagar para ver a foto) e, consequentemente, outros são expostos, chega de pormenores.

Quando confuso, desorientado, hesitante, ou atordoado, sempre foi meu hábito refugiar-me na escrita, tentando captar nas linhas o intangível dos sentimentos. Movidos por esse propósito, há quem pegue nas palavras e forme Arte! Não sendo esse o caso, porquê abrir um blog? E porque se mantém?

Pela pluralidade, diversidade e riqueza das opiniões! Estando longe da perfeição ou da omnisciência, interessa-me ainda mais conhecer e ler os comentários de outros, que adicionem outras maneiras de pensar ou de ver as coisas. Adoro quando diferentes leitores acusam pontos de vista completamente diferentes em relação ao mesmo texto. A maneira como uns se identificam, outros são indiferentes e outros manifestamente não gostam intriga-me, e demonstra aquilo que de mais importante o blog me ensinou:

Todos nós temos um mundo inteiro dentro de nós. Esse mundo contém de tudo, tal como o exterior. Tem vales lindíssimos, praias excitantes, montanhas incríveis... e abismos, monstros, perigos, e fealdade. Dadas as circunstâncias certas (ou erradas), qualquer um de nós se pode encontrar diametralmente oposto à posição que agora ocupa. Não quero certezas invioláveis e compinchas que as assumem como suas... quero as dúvidas, as hesitações e os erros, as maneiras únicas como cada um vê a mesma realidade.

Porque, uma vez expostas, as palavras ganham vida própria e tal como o nosso mundo, cada um vê-as à sua maneira... e nem ao autor pertencem a 100%. Dizem respeito a todos, sem se identificarem com ninguém.

Um beijinho à Estrellinha, que virou Supernova e se estendeu num sofá!

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Acrónimos Ingleses (e um basco)

Dadas as queixas de uma leitora deste blog, aqui seguem umas pequenas dicas:

FYI: For Your Information

ASAP: As Soon As Possible

LOL: Laughing Out Loud

ROTFL: Rolling On The Floor Laughing

OMG: Oh My God

AFAIK: As Far As I Know

SMS: Short Message Service

ROM: Read-Only Memory

RAM: Random Access Memory

AWOL: Absent WithOut Leave

RADAR: RADio Detecting And Ranging

LASER: Light Amplification by Stimulated Emission of Radiaton

JPEG: Joint Photographic Experts Group

Com a contribuição da Gi:

WTF: What The Fuck? (como é que eu me esqueci deste?!?!)

JIT: Just In Time

BFN: Bye For Now

CUL: See You Later (ler em inglês, C U Later :D:D:D)

Com a contribuição do Mcllyr:

AKA: Also Known As (quase um crime esquecer-me deste)

Com a contribuição da Bellatrix:

BRB: Be Right Back

WB: Welcome Back

ETA: Estimated Time of Arrival (outro que é quase um crime não me ter lembrado!)

A contribuição da gata, que quis vir lançar o caos:

ETA: Euskadi Ta Askatasuna ((basco para Pátria Basca e Liberdade)

A enfatização da blueminerva de um outro já existente:Publicar mensagem

OMFG - Oh My Fucking God

A contribuição da fátima:

CBS - Cultural Blog Service!

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Derrapagens

Com tempo de chuva, é preciso ter mais cuidado, e abrandar nas curvas. Mesmo quando se vai a correr!

 

FYI: Aaaaiii! :S

quinta-feira, 13 de março de 2008

Desconheci-te

Vi-te, mas não te reconheci...

Mudaste o corte de cabelo. Estás agora muito mais favorecida, muito mais na moda e muito menos tu. Mudaste o teu guarda-roupa, tal como te mudaste a ti própria, e agora vestes com classe e bom gosto trajes que mostram quem tu queres ser e que escondem quem foste.

Olhei-te, mas não te encontrei...

Sorrias agora muito mais do que antes, mas perdeste o sorriso no olhar. Já não encaras o mundo de frente! Agora, preferes a visão um pouco distorcida do cinismo, reflectida na forma como inclinas o rosto, como um predador a medir as distâncias. A não ser que te sintas desafiada, e aí usas o queixo como seta, que apontas a quem te desafia. Longe vai a timidez, substitída que foi pela segurança que ostentas.

Falaste, mas não foste tu que eu ouvi...

O teu discurso já não é colorido com uma mão que enrola o cabelo, nem tão pouco um franzir da testa de curiosidade. Riste-te, e eu percebi que não já não sabes como! Soltas gargalhadas livremente... mas nenhuma delas possui a alegria contagiante de outrora.

Abraçaste-me e eu não te senti...

terça-feira, 11 de março de 2008

Sexo e(m?) sociedade

Para reflectir:

"O sexo não é uma ganza asséptica, caso contrário, vamos concluir que a vida é uma droga..." by Cold_cold_bitch

Torcidelas - Resultados

A todos os que apoiaram, informo que os resultados do vosso apoio ainda vão demorar uns dias a ser conhecidos. Até lá, eu vou roendo as unhas e tentar escrever algo de jeito por aqui!

Desde já, obrigado a todos.

PS - Os agradecimentos personalizados serão dados a quem cumpriu os requisitos! :P

ADENDA: Posso desde já adiantar que, embora ainda sem resultados definidos, vocês devem ter torcido muito, mesmo!!

segunda-feira, 10 de março de 2008

Torcidelas

Agradece-se a quem passar aqui, o favor de torcer pelo autor deste blog, durante o dia de hoje!

PS - "Agradece-se" apenas a quem demonstrar efectivamente que torceu e pensou positivamente no autor e nos seus desígnios, traga comprovativos de morada (NÃO ADULTERADOS) e se apresente acompanhado pelos pais e com os exames em dia. Isto NÃO será inspeccionado pelo jurí dos concursos, nem pela ASAE.

sexta-feira, 7 de março de 2008

O regresso do Pitágoras

Fui hoje buscar o meu carro ao doutor. Depois de uma série de complicações, descobriu-se que o problema dele, tal como do dono, era o despertar. Mas, ao contrário de mim, nele bastou substituir o motor de arranque, ao passo que eu continuo a ter de funcionar em piloto automático durante as primeiras horas da madrugada (independentemente das horas que forem). Aliás, eu não tenho vida inteligente antes do primeiro café!

Reparo que ele estava mais que na reserva (eu acredito que ele tem alturas em que anda por força de vontade, pois já cheguei a atestá-lo com mais litras do que a suposta capacidade do depósito) e sigo devagar, para lhe testar as pernas. Encho-lhe o depósito e entro na 2ª Circular.

Reparo que o ponteiro do combustível demora a subir, como se me dissesse que não está habituado a ir até li. Pára a cerca de meio depósito, como se estivesse a esticar as pernas, antes de continuar a sua subida, agora mais lenta, como alguém desabituado de chegar aos seus próprios pés com os joelhos esticados...

Aos poucos, vai ganhando a sua habitual confiança de carro experiente, mantendo-se ainda nos 120 (sim, eu sei o limite, não amolem). Vai ganhando cada vez mais gosto na estrada, sente o vento a deslizar pelos lados (façamos de conta que é aerodinâmico - sente mais o vento a criar resistência, mas não é tão bonito), e começa a querer mais.

Quando entramos na CRIL, já ele tinha recuperado a confiança habitual, do alto da sua experiência bastante superior à dos carros por quem passava, e entregou-se ao prazer de rolar sem dificuldades, a todo o vapor (não é assim tão antigo, mas poderia ser, também ficava bonito).

 

Talvez seja o mesmo para algumas pessoas. Tudo o que precisam é de quem lhes repare uma peça vital, lhes dê um pouco de combustível e a confiança de embarcar com elas na viagem, para que percam as inseguranças e se deixem rolar livremente, ao seu ritmo, sem limites de velocidade impostos por outrem.

quinta-feira, 6 de março de 2008

Aparências (III)

Olhou-o, esperançada de um lampejo de reconhecimento. Um pestanajar diferente, um enrugar momentâneo da testa, um trejeito dos lábios. Queria que ele a visse... toda, plena, queria que ele entrasse onde ela tinha medo de ir! Que a levasse pela mão, que lhe mostrasse que não havia nada a temer em si própria.

O seu ar confiante, o riso jovial, o doce ternura com que lhe falava, o franzir preocupado quando se concentrava, tudo lhe indicava que nele se poderia depositar e entregar, abandonando as rédeas do apertado controlo sobre si mesma...

Rir-se-iam juntos, inebriados em si próprios, e transformariam a noite em dia e o dia em noite! Enlevada, dar-lhe-ia a alma, e ele devolvê-la-ia lavada e nova, expurgada de medos e de lugares obscuros. Uma alma nova, a brilhar, que ele lhe daria, a troco de si mesma!

Ele olhou para ela. Ela exibiu o seu sorriso frio, e mergulhou no trabalho, absorta em si mesma. Será que ele a via?, perguntou-se.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Aparências (II)

Irritava-a sentir-se só.
Queria ser verdadeiramente independente! Gostar de estar com as pessoas, mas não precisar de ninguém, de ninguém.

Considerava-se acima das outras. Não se deixava seduzir por meias-tretas. Não se deixava enganar. Criava as distâncias adequadas. Numa sociedade rápida e mutável, agarrava-se com força aos valores de sempre. Eram a única referência que conhecia, a marca que pautava o comportamento de uma mulher, um guia de conduta.

Considerava-se especial. Diferente do comum, da maioria. Muito rigorosa, muito profissional. Exigente com todos e consigo mesma. Eram muito poucos os que deixava entrar na sua vida, e ainda menos os que lá permaneciam. A verdade é que rapidamente a desiludiam. Ninguém correspondia ao que prometiam, ao que tinha imaginado delas.

E ninguém a compreendia... acima de tudo, ninguém a compreendia. Não percebiam o que era seguir a vida pelos padrões que lhe haviam ensinado, o esforço despendido para manter a cabeça em cima dos ombros. Sempre! O decoro era importante, bem como o respeito. Claro que não há problema em brincar, mas dentro de regras.

As regras eram muito importantes na sua vida. O seu incumprimento constante era sinal de um desprendimento e de uma inconsequência que não deixaria entrar na sua vida. As coisas sérias eram para ser levadas a sério!


Jamais se deixaria desiludir outra vez. Era preferível a solidão fria de um apartamento vazio! Mas custava-lhe tanto...

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Aparências

Sabia o que queria para si! O homem com que se imaginava seria atraente, forte, musculado, alto, culto, sensível, brincalhão, romântico, espiritual... etc. A lista apresentava um rol infindável e, se escrita, ocuparia dezenas de páginas. Depois de algumas experiências, e uma ou outra relação mais séria, tinha a plena consciência do que queria, do que não voltaria a ter, do que não voltaria a prescindir.

Não era ela bonita e agradável, divertida e querida?! Não possuía um sentido de humor requintado e inteligente? Porque parecia então que teria de ceder e aceitar menos do que o que queria? Não! Ninguém se deve contentar com menos! Ela não queria ser cobarde, não queria que a considerassem fraca. Não cometeria esse erro, não se acomodaria.

Era uma mulher independente! Educada e culta, experiente, assertiva e comunicativa. Muito profissional, dedicada e competente.

Acusavam-na de mau feitio...

Estava tão só...

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

A última passa

Todo o fumador a conhece. A última passa é diferente das outras todas, completamente diferente.
É sentida de maneira diferente, vivida de maneira diferente.

Começa logo por aí, temos de saber que é a última, antes de a começar, caso contrário não é a última, não sabe bem. O cigarro fica incompleto se não tiver a última passa. Precisamos dessa finalização, desse sentimento de concretização total do acto de fumar um cigarro para que se considere o último cigarro.
Todos os fumadores dão uma última passa no cigarro quando apressados para o apagar. "Porque não o deitas fora? Ainda estava a meio, de qualquer das maneiras..."

A resposta é fácil... porque independentemente da duração, daquele prazer efémero de duração incerta e mutável, precisamos de saber que é a última, que acabou. Ou o cigarro sabe mal, e apodera-se de nós uma sensação de mal-estar, um nervoso miudinho de quem tem algo para fazer, um estado agitado de obra deixada a meio.

Precisamos da última passa para marcar que o cigarro acabou, e que podemos andar livremente e satisfeitos.

Quando o fim de um cigarro não é devidamente percepcionado, todo o fumador terá de acender outro o mais depressa possível... às vezes só com o intuito de dar a última passa.

É claro que para o cigarro em questão, não deve ser agradável ser sorvido com a única finalidade de marcar um final, para depois ser lançado com um piparote para a sarjeta...

Desafio 7 Coisas...

A Maeve e a Helluah lançaram um pequeno (grande!) desafio aqui para o canto.

7 Coisas que sei fazer bem:

- Ouvir
- Sorrir
- Teimar
- Abraçar
- Intuir
- Provocar
- Beijar

7 coisas que não sei fazer:

- Para-quedismo (ainda!)
- Conter o que sinto
- Calar o que penso
- Esperar
- Tirar tempo para mim
- Velejar (ainda!)
- Esquecer

7 coisas que digo frequentemente:

- Foda-se! Puta que pariu!!
- Pois...
- Achas mesmo?
- Merda, esqueci-me do incluir os anexos
- Poucas coisas me chocam
- Carta (LOL!)
- Beijinhos (blogging)

7 coisas que aprecio no sexo oposto:

- Frontalidade
- Calor no olhar
- Sinceridade no sorriso
- Inteligência
- Desenvoltura
- Humildade
- Sentido de Humor

7 filmes preferidos:

- Sete Pecados Mortais (não sei se o desafio não me pôs este na cabeça)
- Forrest Gump
- Clube dos Poetas Mortos
- Uma Mente Brilhante
- A Lista de Schindler
- Kill Bill
- Saw

7 Actores favoritos:

- Scarlet Johansson
- Angelina Jolie
- Monica Belluci
- Natalie Portman
- Johnny Depp
- Nicholas Cage
- Anthony Hopkins

Prova... superada!

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

6 Coisas que Adoro

A Azul quis cuscar a vida de alguns bloggers e saber 6 coisas que adoramos. Como ainda não consegui dizer que não a esta cota-frita-da-tola, aqui vai:

Adoro a minha família! (ok, não toda, pais e mais alguns)
Adoro os meus Amigos.
Adoro música.
Adoro frontalidade, honestidade e sinceridade.
Adoro (bom) sexo.
Adoro um sorriso cúmplice.

Passo o desafio a:

Blackstar
Lady MIM
Gione
Tavguinu e Boda (separadamente)
Princesa Helluah
Cold_Cold_Bitch
Daniela
African Queen
Cati
Ana
Ana
Bagaço

Desunhem-se!

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Barbas

Apetecia-me aquele prazer burguês. Sempre gostei que mo fizessem.
Dirijo-me ao espaço que penso ser próprio, preparo-me para me refastelar e vem a resposta: "Não fazemos isso."
Saio desiludido e entro noutro espaço. A mesma resposta.
Entro num táxi, vou para o outro lado da cidade. Começo a pensar que os tempos mudaram... Certos prazeres começam a ser mal vistos, nesta sociedade cada vez mais impessoal e de pronto a consumir. Não sobra grande espaço para o tratamento personalizado e a atenção dedicada do que pretendo. Começo a ficar frustrado.
Entro noutro espaço. Antes de me começarem a servir pergunto se me dão o que quero. Um sorriso profissional e mais uma negativa. Talvez ali, sugerem.
Percorro o corredor, já preparado para mais uma negativa. A menina de cabelo cor de rosa e piercings nas orelhas e tala na língua ouve-me e exclama: "Não efectuamos esse serviço!"
"Até parece que pedi um broche!", digo para mim próprio.
Quero apenas que me façam a barba. Refastelar-me enquanto alguém se dá ao trabalho de me rapar os pelos faciais, como sempre gostei.
Sei que o meu barbeiro faleceu, mas dirijo-me para lá, na esperança de que estejam abertos outra vez. Um familiar em arrumações informa-me que fecham aos Sábados ao meio-dia, agora... Não sabe onde posso ir.
Fazer a barba tornou-se um serviço quase proscrito, é demasiado pessoal, pode aparecer sangue e deve ser proibido por lei e verificado pela ASAE. Decido que tenho de me dirigir aos clássicos pontos de ligação com o submundo - os taxistas.
Pergunto a um, com bom aspecto, onde posso encontrar um barbeiro, daqueles que fazem barba e tudo. O homem parece confuso e aponta-me um colega. "Ele deve saber."
O tipo é enorme, 120 kgs, casaco de cabedal com forro de lã de carneiro, olhar carrancudo e duro. Faço a mesma pergunta. O tipo mede-me de alto a baixo e diz:
"Está a ver aquela casa amarela. Ao lado tem um rua estreitinha e escura. Suba a rua e quando ficar plana, entre na casa à esquerda. É a barbearia do Zé. É lento, mas faz-lhe a barba."
Sigo as instruções. Começo a subir a rua, afastando-me do resto da realidade. Passa um casal, muito novo, de fato de treino, com uma filha mascarada de joaninha. Um velhote, perdido de bêbado. Duas vizinhas, na cavaqueira sobre as outras, que me fitam sem pudor. Continuo a subir. Um jovem a acender um charro, olhar perdido e derrotado.
Entro na barbearia. Surpreendidos por me verem, três velhotes quedam-se em silêncio. Um deles levanta-se e manda-me sentar.
"Faz a barba?"
"Claro que sim."
Encosto-me na cadeira, com uma sensação de vitória. Estava difícil. O homem é lento, e podia ser melhor... mas não é mau. Trabalha à antiga, com uma prelecção sobre política, futebol, crime, sexo, aos quais se juntam os outros dois companheiros, um deles auxiliado pelo jornal para tópicos de conversa. Discutem uns com os outros e insultam-se mutuamente, enquanto me pedem que tome partido por um dos lados. "Então está por Lisboa? Essa gente não sabe o que faz, por culpa deles é que isto está assim..." Sorrio com o bairrismo tão típico daqui.
No fim, pergunto quanto é. "€2." Deixo 3, atónito.

É por isso que continuo a preferir fazer as minhas compras em Santa Catarina, 31 de Janeiro e arredores. Não quero um mundo anti-séptico, de tratamentos frios e impessoais. Além disso, de serviços sem rosto e sem responsabilidades. Não sou de extremos, e reconheço as conveniências das grandes superfícies, e muitas coisas são lá adquiridas. Mas reconheço a importância de poder dirigir-me a quem atendeu e exigir um melhor serviço, ou uma atenção pessoal.

Numa época em que magotes de pessoas recorrem ao esoterismo e à religião em busca da sua individualidade, em que dezenas dos nossos conhecidos se sentem perdidos e sem identidade, cada vez é mais difícil sermos distinguidos. Somos apenas um número, mais um na fila, perdidos entre milhares de outros iguais.
A eficiência tem de ser um critério de selecção de negócios, sempre. Mas não é o único critério a ser aplicado, e pode não ser o mais importante.

Para o Sr. Zé, barbeiro que faz barba, um grande bem-haja.

Adenda: Embora o departamento de higiene e segurança do trabalho nada tenha a dizer, uma perita externa para a qualidade classificou a obra como imperfeita. Sr. Zé, espero melhores resultados na próxima vez!

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Revolução

Abeirei-me duma povoação em polvorosa, gritos de Revolução ecoavam no ar. A turba convergia para a praça central, em grande frenesim. Sentia-se no ar um ambiente dionisíaco e uma expectativa crescente.
Movido pela curiosidade, juntei-me a eles e tentei indagar de que se tratava. Ninguém acalmava o suficiente para explicar, gritavam apenas que finalmente tinha chegado, a Revolução há tanto tempo esperada.
Sorriam e desfilavam pelas ruas num êxtase frenético de antecipação, em todos se sentia a excitação, o entusiasmo pulsante e a esperança. Por todo o lado, casais perdiam o pudor e entregavam-se ao prazer, demasiado em brasa para esperar. Vizinhos de anos trocavam olhares cúmplices com as esposas uns dos outros, inebriados por um perfume de liberdade.
Sigo para a praça central, onde a cidade está lentamente a concentrar-se por completo. Vêm-se carícias, corpos nus e ouvem-se risos, beijos e gemidos, lembrando-me Patrick Suskind.
Começo a perceber do que se trata...
Começam a levantar-se cabeças, a olhar em volta. Onde estão os líderes da Revolução, perguntam-se. Quem foram os revolucionários e porque deixaram a obra a meio? Cada vez mais rostos intrigados se levantavam. E agora?

Lentamente, a euforia e a adrenalina desaparecem, deixando lugar à hesitação, ao medo e à incerteza. Sentiam-se abandonados pelos revolucionários. No ar, ficaram palavras de ordem e uma ideia de um rascunho de um esboço de uma proposta de um possível novo código moral.
Quase nada, portanto. Sem guias nem dogmas que os orientassem. Sem líderes nem ditadores. Sozinhos.
A incerteza e a dúvida pairavam nos seus rostos. Não conseguiam, ou não queriam, perceber que era o momento em que detinham eles o poder sobre si próprios, em que podiam de facto moldar o seu novo mundo. Começaram a abandonar a praça, tentando em vão assimilar um pouco da liberdade e acabando por a misturar com o velho e fétido código, ainda não totalmente posto de parte.
Em comum, levavam apenas um estigma de liberdade, um cheirinho de responsabilidade. Um direito, que sentiam como obrigação, de serem felizes, embora não soubessem como. Queriam que lhes dissessem como, que lhes mostrassem, como se crianças fossem.

Fiquei a vê-los a afastarem-se. Por instantes, podiam ter acabado de vez com todos os tabus que pautavam esta estranha tribo, e espantado todos os fantasmas e esqueletos dos armários. Tinham a hipótese de começar de novo, de se reinventarem e renascerem de si próprios, mas preferiram desiludir-se com a ausência de instruções, e recolher a medo, polvilhados de dúvidas, às suas casas, a assumir a responsabilidade da reconstrução. Condenaram-se a mais um período de frustração, insegurança, medo, desrespeito e tristeza. A cidade ainda não estava preparada para se auto-erigir e renovar. O medo ganhou desta vez.

Mesmo antes de voltar costas e prosseguir viagem, fixei os olhos no centro da praça. Uns poucos tinham ficado. Decidiam ser os seus próprios mestres, os seus próprios deuses. Perceberam a extinção do antigo e queriam ter uma voz na construção do novo, preferiam o erro à inactividade. Juntei-me a eles por um pouco. Nas vozes, planos entusiastas e mirabolantes, devaneios eufóricos e sonhadores. Os tabus não viviam ali, os medos não se sobrepunham, e aquele pequeno grupo pegava nas rédeas de eles próprios. Deuses de si próprios, reunindo-se para confraternizar no Monte Olimpo, disfarçado de praça central de uma qualquer povoação...

Despedi-me com satisfação. Mais viajantes se formavam.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Medidas Socratianas

Para todos aqueles que estão preocupados com a diminuição das receitas no imposto do tabaco, por causa da nova lei, podem parar de se preocupar.
Além de todos fumarem exactamente o mesmo (pelo que ouço), aos choques térmicos que tenho apanhado vou andar a comprar medicamentos o ano inteiro.

Perdem os cafés e restaurantes, mas ganham as farmácias e farmacêuticas. É de mim ou os princípios da redistribuição da riqueza deveriam funcionar ao contrário?

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Adeus, Roque

Dizíamos entre nós que eras um tipo de sorte. A Morte parecia incapaz de te tocar. Tiveste a PIDE à perna várias vezes. Fosse o 25 de Abril a 26, e estarias preso. Sobreviveste a meia dúzia de acidentes incríveis. Ileso, chegaste a tirar todos os passageiros inconscientes do carro e correste atrás do culpado. Rasgos inexplicáveis de sorte faziam-te escapar à derradeira armadilha, por muito traiçoeira que fosse. Árvores que caiam onde tinhas estado um segundo antes. PIDEs que eram chamados de volta mesmo quando estavam para te apanhar. Por um engano numa carruagem, e algum sono, enterraste um amigo, que ocupou o lugar que era sempre teu, quando não apareceste.

Sei agora o que não vi antes. Tantas armadilhas só poderiam querer dizer que Ela estava determinada atrás de ti. Para nós, que te chamávamos de imortal, deixou a ironia da persistência. Numa última armadilha, apanhou-te. Porque te queria tanto, não saberei dizer.

Foste dinâmico e activo na tua vida, embora discordássemos frequentemente. Deixaste amigos do peito pelo país e estrangeiro, e especialmente na tua cidade, tua de tantas formas e feitios. A cidade do conhecimento deve-te muito. És responsável pelo bem estar de dezenas de crianças e pelos sorrisos de centenas, entre as quais me incluo. Um anfitrião simpatiquíssimo, que sempre tive o prazer de apresentar e dar a conhecer a todos os meus amigos.

Que os estudantes se enlutem, os mercados se fechem e que a cidade gema um fado tão seu... e tão teu...

Adeus, Roque!

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Cumplicidade

"Como corre a vida de um Viajante?" perguntaste, quebrando o ritmo dos nossos risos habituais. Os teus olhos lampejaram de curiosidade e satisfação, na cumplicidade íntima que nos é tão característica, desde sempre.

Sorri-te. Há muito tempo que não falávamos, desde que eu decidi palmilhar o mundo, e tu decidiste dar-me alta da tua lista de cuidados intensivos. Sempre soubemos quando estar juntos. Nunca um de nós falhou um momento importante do outro, mesmo aqueles que não têm importância nenhuma. Sucedem-se meses até que um qualquer acaso nos junte... e é como se tivesse sido ontem.

Tínhamos acabado de nos sentar. Tu preferes caminhar enquanto falamos, deixando que o movimento ritmado do corpo dite a cadência das palavras. Eu sei sempre tanto pelo teu caminhar como pelo que dizes. Porém, sabes que eu prefiro reflectir enquanto caminho. Também o meu passo me trai, pois sabes sempre o que me perguntar depois. Pequenas provocações só possíveis entre nós.

Sei tudo de ti, e tu conheces-me como ninguém. Na nossa intimidade de anos, nunca tentámos fazer do outro alguém melhor e exactamente por isso continuámos assim. Apesar de tão diferentes na vida, de caminhos tão separados que só se cruzam devido à vontade, mantivemos a filosofia comum de criticar sem julgar.

Sabemos sempre quando nos despedir, saciados e felizes, quando terminamos de nos reaproximar. Partilhamos tudo, trocamos abraços e retomamos o nosso caminho. Como dizes, "de alma cheia e coração saudoso, até que nos cruzemos de novo, por aí."


Não há silêncios entre nós, mesmo quando estamos calados.


E é raro haver amigos como nós... tão cúmplices, há tanto tempo.

domingo, 20 de janeiro de 2008

Sorrisos

Dizem que os olhos são o espelho da alma, e são-no de facto. Mas demoram a ler, porque exigem que a contraparte abandone a atitude perscrutadora inicial. Mas um sorriso é quase sempre revelador. Pode ser sincero, falsificado, irónico, triste, amarelo, melancólico, provocador, arrogante... nenhum é igual ao outro.

Discordâncias

Foi-me enviada por email a seguinte previsão astrológica: "A Lua em Sextil a úrano pode trazer surpresas e impulsividade à sua vida emocional. Neste momento poderá encontrar alguém que desafie a sua perspectiva."

Merda! Estava a pensar discutir a questão "viatura de serviço" na empresa...

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Interpretações

Inconscientemente, tendemos a assumir a comunicação como directa, lógica e consequente. Como se as mensagens que enviamos e recebemos fossem transportes perfeitos das ideias que lhes deram forma. Sabemos que não é assim, mas acabamos por cair no erro de, ao interpretar uma mensagem, abordá-la do nosso ponto de partida, identificando as nossas opiniões e valores. Ou cair no erro que os nossos destinatários entendam exactamente o que queríamos expressar.

O poema do post anterior é disso exemplo. Há quem o pense como uma sátira. Há quem o interprete como uma verdade. Há quem o entenda como um desabafo da alma, um grito de frustração!

Há quem o sinta como ilustrativo de como o amor se sobrepõe a tudo, de como não é influenciado por nada. Não importam os defeitos, os vícios, as dores, porque não são elas que dominam um coração. Apesar dos caminhos tortuosos, das injustiças e dos sofrimentos, o amor não se prende com nada disso, e existe para além dele, num outro plano.

Quando vivemos tempos em que o romantismo nos é apresentado como filmes lamechas em que acaba tudo bem, ou contos de fadas que já estavam desactualizados nos tempos dos nossos pais, já quase não se houve falar das grandes entregas amorosas. As relações são encaradas como a escolha de um automóvel, ao mínimo problema, compra-se um novo, a não ser que não estejamos em condições de ir ao mercado. Nesse caso, aguentam mais um pouco, porque mais vale ter alguma coisa que nada.

Prefiro as pessoas que assumem que não têm veículo, e que apenas dão umas voltas quando lhes apetece. Com honestidade e naturalidade, assumem a sua independência em não estar amarrados a um carro em particular. São francos e sinceros na sua abordagem das relações humanas e sexuais, muito embora essa postura seja muitas vezes, em si própria, mais um mecanismo de defesa preventiva que uma verdadeira concepção.

Por outro lado, cada vez é mais difícil para homens e mulheres manterem esse tipo de relações semi-independentes. O risco de confusão quanto às expectativas e envolvimento da contraparte é grande, originando desentendimentos e o fim das mesmas, em muitas situações. A dada altura, também nesse tipo de relação é difícil manter a sintonia. Talvez, por não existir tanta cumplicidade, a empatia seja ainda mais difícil de manter... Mas a coisa também se queria leve, portanto finge-se que não há problemas quando termina.

Tal como um automóvel, adopta-se a atitude consumista, procura-se algo novo. Há 15 anos atrás, lembro-me de arranjar a televisão a cores quando avariou (e ainda dura). Lembro-me do meu pai desmontar o motor do carro por completo (e acho que lhe sobraram peças, mas o carro não se queixou).

As grandes loucuras de amor (e não falo de gestos grandiosos para impressionar) já quase não existem.

Talvez por isso, há quem leia o poema e sorria, pensando que, com todos os defeitos que se possa ter, o Amor supera-os a todos... ou, pelo menos, tem em si essa capacidade, esse poder.

Às vezes, penso que é mesmo assim (Mulher)

Mulher,
mal que, por meu mal, és o meu bem.
Qualquer
sabe que és leal, só quando és mãe.
É louco, é sandeu, quem disser
À mulher, seja ela qual for:
"Mulher, tu és o amor!"

Não,
não és, tu és só traição de lés a lés.
Mal vês preso um coração pisa-lo aos pés.
Em cem como tu conto as cem,
Entre as falsas, pois cego eu não sou,
Mas diz-me outra vez amor vem,
Diz-me que eu vou!


"Mulher" - Tuna de Medicina do Porto

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

A Fugitiva

Na curva de um caminho, depara-se-lhe uma menina frágil e assustada. As roupas rasgadas e os cabelos em desalinho, olhos muito abertos sem ver, arranhões nos braços e pernas e respiração ofegante, era evidente que tinha atravessado o bosque a correr, em fuga de algo...

Quando atrapalhada, recorre ao mesmo método de sempre. Um que, apenas aparentemente, lhe dá consolo. Um que, aparentemente, a conforta e sustém em tempos de crise. Na verdade, um escape que a afasta de si própria, e a prende a uma roda, na qual corre incessantemente. Incapaz de lidar com a sua própria frustração, assustada com a ideia de se imaginar pequenina e frágil e aterrorizada com a ideia de não controlar o seu mundo, nem a si própria, foge.

Corre apavorada, passando veloz por tudo, saltando muros, levada por um pânico avassalador de uma vulnerabilidade que imagina pior do que é (embora nunca a admita). Foge, rápida e letal, na vã convicção de que se não vir não existe, atacando ferozmente tudo o que, na sua mente, é um obstáculo ao seu objectivo principal e imediato: a Fuga.

Seguidamente, trata de rapidamente restaurar a sua habitual projecção de si própria, apontando um holofote a qualquer coisa que desvie a atenção, tentando que a escuridão encubra medos, falhanços e desejos irrealizados. Com anos de prática, é extremamente hábil na arte (que teima em perpetuar) de se mostrar forte, divertida, destemida e independente, eliminando da sua vida todos os que se atreveram a questionar essa imagem, ameaçando expor o Inaceitável. Transfere para estes toda a sua raiva e ódio, e dá lugar ao desespero que sente, num turbilhão de emoções contraditórias. Consome todas as emergias num esforço imenso, que se torna cada vez mais automático, e que lhe permite a ilusão de controlo, de acção, de resolução.

Observa-a partir de regresso à Roda que ela própria criou. Um dia, o aglomerado de medos, problemas e frustrações ingorados será um gigante demasiado grande para ocultar, demasiado forte para lhe fugir e demasiado pesado para o suster. Como um novelo gigante, terá de ser desmontado lentamente, com o quádruplo da coragem que lhe teria custado lidar com os fantasmas todos faseadamente...

... por outro lado, ninguém melhor que ela para enfrentar um Golias, quando encurralada e a isso for forçada.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Passeios

Entrou no carro e arrancaram face a um passeio sem itinerário planeado, sem destino concreto. De imediato, sentiu-lhe o peso da expectativa, o medo da incerteza do desconhecido a aflorar-lhe nos olhos. Na postura artificialmente natural, adivinhou-lhe os receios, intuiu os desejos íntimos e sentiu as vivências marcadas.

Sabia que tinha uma decisão a tomar, ou melhor, sabia que tinha de decidir agora se prosseguia com o que já havia escolhido. Conhecia de cor os maneirismos, olhares e atitudes que poderia adoptar, jogos tantas vezes treinados e efectuados, jogos de que estava farto e não queria mais jogar, como uma criança que põe de lado de vez os Lego.

Abandonou as armas e barreiras exaustivamente empregadas em situações idênticas e deixou-se conduzir por caminhos pitorescos e vistas fabulosas, enquanto a conversa fluía naturalmente sobre pequenos nadas. Evitou propositadamente todos os temas que se havia acostumado a habilmente introduzir, entregando-se simplesmente ao prazer de desfrutar um passeio simples, absorvendo o momento.

Saltitaram de lugar em lugar, de nada em nada, enquanto ele se deixava conhecer sem máscaras e lhe dava espaço para, gradualmente, despir a sua. Deambularam por espaços belos, paisagens românticas e refeições vividas enquanto prosseguiam naturalmente e com desenvoltura a conversar, pormenores importantes apenas para eles próprios.

Finalmente, horas depois, ela despiu um dos véus que a cobria. Ele sorriu-lhe e despediu-se placidamente.

domingo, 6 de janeiro de 2008

2008!!

"Como te correu 2007?"

Quando questionado sobre o ano anterior, deixei-me rever rapidamente os acontecimentos desses dias estranhamente numerados...

Foram 365 dias dilacerantes, sem dúvida, pautados por alterações brutais, que destruiram e arrasaram muitas das convenções em que me havia deixado mergulhar, em mim e nos outros. Transições em demasia, alterações profundas e choques não solicitados, que destruiram a solidez do mundo imaginado e expuseram a realidade nua e crua de um mundo que, subitamente, se apresentava como hostil e avassalador.

Buscando respostas, saltando de conclusão em conclusão, e encontrando-as sempre insatisfatórias, fui forçado a entrar em mim próprio e reconstruir a minha própria identidade à luz de um novo mundo, ou de uma nova percepção dele próprio, e a repensar a minha própria postura nele.

Reinventando-me, escolhi um novo trajecto, um novo curso, um novo papel no grande teatro Shakespeariano. Eu seria o Viajante, fiel ao princípio de recusar a ilusão da acomodação, de arriscar sempre o caminho não trilhado, o próximo monte, ao invés do contentamento. Nesse processo, novas desilusões, novos desafios perdidos, escolhas erradas, becos sem saída. Cada um de nós tem a capacidade inesgotável de se iludir a cada instante, distorcendo a nossa percepção do real para o que desejamos ver. Deste modo, é aparentemente de forma natural que saímos de um caminho errado para enveredar por outro que aponta na mesma direcção.

2007 foi, acima de tudo, o ano em que despertei da letargia. Talvez ainda mais apropriado seja dizer que foi um ano de renascimento do choque que me havia feito despertar, o fim de um ciclo obscuro de luzes cintilantes e o início de um trilho luminoso na escuridão.

"Sabes, é-me difícil classificar 365 dias num só rótulo." "Vá lá, de uma maneira geral, como correu?"
Volto a rever tudo num segundo, enquanto uns olhos expectantes e penetrantes me fitavam, e sorrio interiormente.
"Atirou-me numa nova direcção. Fez-de mim quem sou agora, quem tu estás a conhecer."
Com um sorriso atrevido, fui mais uma vez questionado "E 2008?"


Alargo o sorriso interior aos lábios, enquanto nos arrasto até ao balcão para mais uma bebida e murmuro ao ouvido "Ele que venha!"