quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Um pouco de NonSense por dia, não sabe o bem que lhe fazia

Anónimo diz:
hádes crer e num ter
eheh
dois tiros num só disparo hem
Eu disse:
três
“num” é um regionalismo, com transcrição fonética, mas sem forma escrita
fiquei hoje a saber desta
Anónimo diz:
sim...
num é mais uma traque, nem é bem tiro...
Eu disse:
no mínimo, uma facadita
Anónimo diz:
isso
Eu disse:
passa despercebida, mas a gramática fica ferida
bem como a ortografia
Anónimo diz:
e morrem golfinhos
Eu disse:
é uma tristeza, meu caro, uma barbaridade
Anónimo diz:
a gramática é bem rija, DERIVADO AOS CHUTOS que leva
Eu disse:
acho q qerias dizer Xutos
Anónimo diz:
adoro esta
derivado ao
derivado ao tempo a colheita foi-se
muito bom
Eu disse:
acho q te vou citar no msn
Anónimo diz:
podes fazê-lo sem problema
Eu disse:
nunca derivaste em ordem a y e a x?
tb podes derivar aos xutos e ao tempo
Anónimo diz:
tás a ver
matemática na gramática
olha tenho de bazar derivado a ter de ir dar uma ajuda em casa a segurar o puto...
avrassos e comprimentos

domingo, 8 de novembro de 2009

Ritmos africanos

“Não.”

Ela recusava-se a ouvir o som que os ouvidos lhe transmitiam.

Havia vestido umas calças de cintura descaída, aparentemente largas, mas que lhe desenhavam muito bem as formas por baixo. Um top cai-cai, já que se podia dar a esse luxo, revelava pele morena e uma barriga lisa. A maquilhagem também estava bem desenhada, com linhas negras rodeadas de um sombreado verde-azeitona a prolongar-lhe o formato dos olhos, e um batom que lhe escurecia o tom dos lábios finos, ao mesmo tempo que lhes aumentava o brilho.

Tinha chegado mais do que elegantemente atrasada, com um sorriso e um beijo para todos os que conhecia. Um Gin Tónico depois, dirigiu-se para o centro da pista, onde ele já se encontrava. Iniciou a sua dança feita de movimentos europeus misturados com angolanos, sem nunca nele pousar os olhos. Ela sabia o quão provocante a indiferença pode ser, se em doses controladas. Contudo, todos os seus movimentos, apesar de não o parecer, a ele estavam dirigidos. Não por qualquer motivo romântico. Nem mesmo uma atracção sexual, se bem que sexo estivesse nos planos. Apenas queria que ele a quisesse sexualmente, tal como havia querido outros noutras noites e outros quereria depois.

Prática e um dom pessoal, talvez o de uma personalidade assim construída, haviam-na dotado de imensa perícia nos movimentos e ondulações, nos olhares indiferentes enquanto as ancas provocam, no virar de costas enquanto o rabo convida, nos olhares fechados enquanto a pélvis balança e o rosto se ilumina de prazer pseudo-antecipado.

Quando o DJ muda para Kizomba, ele convida-a, tal como espera. E, tal como já tinha observado, ele era bom. Havia praticado. Uma braço quase enlaçado nas suas costas, a mão descendo ao fundo das costas e além. A outra mão no ombro, os dedos perto do pescoço. Ela agarra o meio das suas costas enquanto lhe puxa a cabeça pela nuca até ao pescoço.

Há quem pense que Kizomba é masculino. Na verdade, é um veículo bem feminino de sedução e expressão da sensualidade e sexualidade feminina. Ele conhece bem o seu papel. Sempre colados, vai-lhe dando o espaço para a sua dança. Guia-a em passos de 2 por dois, que mudam para 1 por dois, para um por um, e para 2 por 2 outra vez… Nos intervalos, as pausas, em que apenas ela se mexe, as ancas rebolando e a pélvis provocando-o constantemente. É um ritmo quente. Tal como ela.

Sabem que estão a ser observados. olhares de cobiça e inveja, alguns de desdém. Ele não se importa. Ela vibra com isso. Continuam por mais 5 músicas, os seus corpos já transpirados devido ao calor da sala, das luzes, e dos seus corpos sempre colados.

Por fim, ele afasta-se. Trocam sorrisos e ele vira costas para uma bebida. Ela dança sozinha mais um pouco. Vai ter com ele ao bar e pergunta-lhe: “Vamos a minha casa?”

“Não” é a resposta que continua sem querer ouvir.

Expatriado

De volta, passados tantos meses. Pelo menos, assim o espero!

A vida em Angola está repleta de desafios. Sempre acreditei que somos tão grandes como os desafios que superamos. Sem dúvida alguma, Angola provou ser um desafio constante e enorme. Ao contrário do que se possa pensar, não é a falta de certos luxos ou confortos, por mais que isso pese. Também não é a falta dos amigos ou familiares, se bem que isso pese muitíssimo.

Não… O grande factor que contribui para que vários tugas desistam ao fim de uma semana, e tantos, mas tantos, desistam ao fim de um ano, é a total disparidade das pessoas face ao que consideramos familiar.

Faz-me lembrar uma anedota que ouvi há muitos anos: A professora pede à menina rica para descrever uma família pobre. O seu intuito é que a menina perceba as diferenças de classes e a sorte que tem. A menina, que até tem bom coração, vai para casa trabalhar no assunto. No dia seguinte, apresenta a sua composição: “Era uma vez, uma família pobre. A mãe era pobre, o pai era pobre, a ama era pobre, o jardineiro era pobre…”. A menina simplesmente não conseguia imaginar uma realidade tão diferente da sua.

Não é de pensar mal da menina da história. A maioria de nós só conhece e consegue perceber a vida de outras classes porque a observamos e com ela interagimos. E esse é o grande problema de tentar perceber a vida em Angola. Não é uma escala europeia reduzida devido à falta de certas infra-estruturas ou bens. É toda uma cultura diferente, completamente diferente da nossa.

E essa é a grande razão para que tantos tugas decidam voltar a casa ao fim de um ano. É que as diferenças vão-se tornando cada vez mais discerníveis com o tempo que cá passamos. E um sentimento de desenquadramento acentua-se. Em todos os países por onde os tugas se espalham, nascem comunidades que tentam preservar algo em comum de Portugal. Mesmo quando a maioria desses países apresentam culturas e valores muito semelhantes aos nossos, por terem as mesmas bases (Império Romano, Igreja Católica, troca mercantil, etc…). Em Angola, essas semelhanças são apenas aparentes.

Apesar de todos os anos de colonialismo, apesar das dezenas de milhares estrangeiros que aqui habitam, Angola conseguiu assimilar parte dos hábitos “ocidentais”, mantendo em grande escala a cultura que sempre tiveram, uma das mais antigas do mundo.


Mais do que as dificuldades, a falta de luz e água potável, os preços exorbitantes, é a diferença cultural que mais dificulta a vida em Angola. E, para isto, ninguém pode ser avisado. Tal como a menina da história, não há como explicar aquilo que tem de ser vivenciado.

domingo, 22 de fevereiro de 2009

Professores – educadores?

Começou por resposta aqui, e acabou em post.

 

Confesso que acho que o professor deve ser um educador quando com os alunos. Na aula e em todas as actividades daí resultantes.

Mas isso levanta a questão de onde termina o papel do professor. Na minha opinião, ao professor compete educar para a cidadania, para a sociedade. E esse papel deve estar presente em todos os contactos com o aluno.

Quanto a trazer trabalho para casa, essa é a razão pelo horário reduzido. E, se os professores acabam por estender esse horário mais do que o suposto (e eu sei que muitos o fazem), a verdade é que nas outras profissões fazem o mesmo ficando até mais tarde ou levando projectos para casa. E, falando por mim, eu gostaria de ter a vantagem da flexibilidade de horas a mais no meu dia, estruturando-o como quiser.

Mas há limites. A nenhum professor pode ser pedido que eduque fora da escola. Nesse ponto, concordo em absoluto. Ou então, os pais que peçam ajuda também para os fazer. Do estilo: "OLhe, já que vai educar o miúdo daqui a uns tempos, não quer passar lá em casa na terça. Eu digo à patroa para estar à espera."

O problema de fundo é que eu continuo a não ver resolvido. Os sindicatos lutam pelos privilégios de alguns e ignoram a insegurança de muitos novos (e muito mais bem formados) professores. Nas negociações, rapidamente esquecem os milhares de recibos verdes e não efectivados, como se viu. E são estes que pagam pelos benefícios dos outros.

Além disso, adoptam atitudes arrogantes, mas sempre contaram com o apoio popular para vencer as suas lutas. Tiveram-no durante tanto tempo, e apesar de tanta asneira cometida, que pensavam que eram apenas eles quem ganhava as lutas. E descuraram quem nbão merecia…

Tenho muita pena por milhares de professores injustiçados, por professores que se esforçam, que se envolvem, que se preocupam e que encontram/inventam soluções para contornar inúmeros problemas, pois estão a pagar pelos erros de uma classe que consegui antagonizar a opinião pública. Sabendo nós que, ainda agora, a profissão de professor é altamente estimada por todos os portugueses, pergunto-me porque é que ainda não foi feita uma reflexão para saber o porquê disto. E não, a resposta não é unicamente inveja.

No sector privado, na maioria das profissões e até em alguns estabelecimentos de ensino privados, premeiam-se resultados. É assim que a avaliação é feita. Concordo que devemos ter muito cuidado no modelo de avaliação e nas regras e fiscalizações do mesmo, para que levem aos objectivos que queremos DA FORMA que queremos. É necessária avaliação numa classe que ocupa uma parte considerável do erário público e onde muitos entraram (todos o sabemos) por não conseguir mais nada. É necessária avaliação numa classe que forma, todos os dias, a próxima geração.

Por outro lado, sem uma clara política de educação a longo prazo, integrada e sustentável, com agendas políticas variáveis, sem objectivos finais claramente traçados... sinceramente, vão avaliá-los em quê?!

 

Faz falta um Presidente que imponha um cessar-fogo e force o diálogo. Podia ser que uma solução integrada emergisse, se ambas as partes cedessem. Pelos nossos filhos (inclusive os dos professores).

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Previsões

Vivemos tempo conturbados de invertezas económicas. O ex-gigante EUA tornou-se, na última década, uma bolha especulativa financiada pela China. Contudo, a própria China pode ver-se em maus lençóis se a crise se alastrar pelos EUA. Os títulos de dívida pública que a China comprou aos EUA para os permitir a continuar a importar produtos chineses (estes tipos são espertos, há que admiti-lo) poderão não valer um chavo amanhã. E todos sabemos a influência que a China tem na economia mundial e as consequências que a sua queda acarreta.

No meio de todo este caos, muitos se perguntam como é possível termos chegado a este ponto.

"Os donos do capital vão estimular a classe trabalhadora a comprar  
bens caros, casas e tecnologia, fazendo-os dever cada vez mais, até  
que se torne insuportável. O débito não pago levará os bancos à  
falência, que terão que ser nacionalizados pelo Estado"
Karl Marx, in Das Kapital, 1867

Não defendo teorias de direita ou de esquerda, porque não me identifico com nenhuma delas. Acredito na concorrência como o melhor meio de aumentar a eficiência produtiva com o mínimo de recursos. Nem a Natureza, que é a Natureza, encontrou forma melhor. Agora, será que eficiência produtiva é um objectivo que deveríamos perseguir com todas as estruturas da sociedade (tal qual o fazemos agora)? A ideia de crescimento como objectivo, que já se deveria ter abandonado desde a introdução do conceito de desenvolvimento, nunca foi abandonada. Continuamos a viver numa cultura de que maior é melhor. Carro grande, casa grande, mamas grandes, grandes lucros, enormes vendas, crescer, crescer… Tal qual tumores.

Está claro que os modelos económicos estão a falhar. É certo que a teoria económica vai avançar com uma explicação para os livros. Excesso de free-riders, elevada corrupção, mecanismos reguladores deficitários, crise de confiança no sistema, and so on, mercados emergentes e saturação, etc…

Não partilho das ideias utópicas de Karl Marx. Contudo, nenhuma universidade do mundo deixa de ensinar a sua teoria e pensamento económico. Tornou-se uma referência no estudo do capital e filosófico e não pode ser descartado. É claro que uma citação, desprovida do seu contexto, pode ganhar inúmeras interpretações.

 

De qualquer modo, acreditem em quem leu, era mesmo a isto que ele se referia.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Colibri e o Sexo

Apesar de lembrar algo como “A Anita na Quinta” – e de igualmente nos proporcionar grafismos de conteúdo explícito – esta é apenas mais uma forma que os visitantes deste espaço encontraram de voar até aqui. É de premiar a originalidade de tal leitor que pensou “Qual a forma original de voar até aquele blog” e, vai daí, escreve esta péroloa, digna de contos infantis, no Google.

Comentando isto com um amigo, ele questionou se não seria possível ter sido uma pesquisa séria. Rapidamente cheguei à conclusão que não poderia ser. Tal laivo de genialidade só pode ter sido originado por uma mente criativa, não por um ornitólogo empenhado em descobrir mais sobre as qualidades procriativas (e recreativas) de um colibri.

Não que não fosse uma ideia interessante! Um tal livro poderia incorrer sobre as aventuras e desventuras dum jovem colibri e as suas companheiras. Explicar o seu voo acelerado quando elas chilreavam a palavra “ninho”, “ovos” ou “anel”! As acrobacias de umas, a passividade de outras, o entusiasmo destas e a timidez daquelas… Um tal livro seria depois distribuido pelas associações de ornitologia e columbofilia de todo o país! Sem dúvida!!

Quanto à pobre alma que chegou cá procurando “vontade mútua desejo simultâneo”, acabou de sugerir um outro excelente título para um livro, ou até mesmo o novo filme de Angelina Jolie. Imagino já, o jovem colibri, envolvido em voos rasantes, explosões de ninhos e missões subaquáticas, enquanto tenta despertar a vontade da pássara da Gi (a Angelina, não a blogger), ao mesmo tempo que se “desperta a si próprio”.

Talvez, num tal filme, a expressão “Faz-me um bico!” fosse apropriada…

Há cada um…

sábado, 24 de janeiro de 2009

Heróis – full disclosure?

Depois de vários meses com o blog em stand-by, os leitores que permanecem são aqueles que, de uma maneira ou de outra, me conhecem bem. Seja por troca de emails, conversas no msn/skype, telefonemas ou contactos pessoais, a verdade é que a maioria de vós acaba por saber muito de mim.

Juntando a isso a troca de opiniões nos respectivos blogs, sobre os mais variados assuntos, muitos de vocês têm a obrigação de conseguir adivinhar (e JUSTIFICAR) quem terá sido um dos meus heróis de infância.

Para além disso, convido-vos a, sabendo de antemão que se estarão a expor, enviarem por email o nome do(s) vosso(s) herói(s) de infância/adolescência. Apenas o nome basta, mas podem acrescentar a informação que quiserem. O resultado conjunto será agregado num post com a minha interpretação pessoal de cada herói e do seu significado, sem qualquer menção aos contributos que chegarem.

Por último, deixo a lista de possíveis candidatos a meus heróis:

  • Pateta
  • Pai-Natal
  • Mário Soares
  • Fantasma
  • Cavaco Silva
  • Dartacão
  • Tio Patinhas
  • McGyver
  • David Hasselhof
  • EU
  • Kurt Donald Cobain
  • Belmiro de Azevedo
  • José Saramago
  • Patrick Swayze

Será que alguém adivinha?

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Heróis – admirados ou invejados?

A questão assaltou-se-me ontem à noite, numa noite de casino com alguns amigos. Com uma nota de 20 USD no Blackjack, jogo que bastante aprecio, consegui um retorno de 570 USD. Foi uma luta titânica, de algumas horas, e que deu um lucro completamente inesperado. Ora, quem me conhece, sabe que eu defendo que alguém que vai a um casino, deve levar dinheiro para GASTAR, sem qualquer ilusões de lucros e ganhos, tal e qual como se fosse ao cinema, ao teatro ou a outro lado qualquer. Não se trata de um investimento, tal como um carro também não o é… trata-se de um GASTO. Frequento casinos já há vários anos, sempre com esta filosofia. Escolho de antemão o dinheiro que vou gastar em jogo nessa noite e NÃO TEIMO com o jogo. Apenas passo algumas horas a fazer algo que gosto, com a possibilidade de não ter de pagar por isso e até de ganhar.

Mas a obssessão de muitas pessoas por ganhar é enorme. E só isso explica a frase “És um herói!” que me foi dirigida repetidamente ontem. Não houve qualquer acto de heroísmo da minha parte. Apenas um bom conhecimento do jogo aliado ao factor SORTE. Então, porquê a excitação e ansiedade que aquela sala viveu durante mais de uma hora, em que se conseguia sentir a tensão em momentos mais arriscados, os suspiros de alívio quando conseguia recuperar e o silêncio cortante quando estava em apuros? Porquê as palmadas nas costas e as gargalhadas quando superava uma jogada com muito dinheiro investido?

A explicação é simples. Na verdade, é a inveja que determina a nossa eleição de alguém à categoria de herói. Admiração e inveja caminham assim de mão dada, uma não existindo sem a outra.

A escolha de heróis diz muito sobre as pessoas. Permite espreitar as suas motivações, as suas ambições e as suas frustrações. Conhecendo o herói de alguém, conhecemos os seus objectivos e as atitudes tornam-se quase transparentes. Dado que essa escolha é, na maior parte das vezes, automática e irreflectida, ela torna-se ainda mais sintomática dos medos e fraquezas de alguém. Tendemos a invejar (ou admirar, se preferirem) aqueles que superaram o que nós não superámos, que conseguem o que nós não conseguimos, que têm o que nós não temos. E, devido a isso, elevamo-los a uma categoria superior, inferiozando-nos a nós próprios. Ou seja, através do herói de alguém, sabemos quais os seus desejos, as suas prioridades, aquilo que considera importante, aquilo que secretamente almeja.

Será importante, como um exercício de auto-estima e auto-suficiência emocional, avaliarmos aqueles que invejamos/admiramos, e retirá-los do pedestal feito por nós. Especialmente sendo uns tolos que a única coisa que conseguiram, foi ter sorte!

 

Eu já reavaliei o meu herói de infância e tirei as minhas próprias ilacções…

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

O meu padrinho

Saiu de Portugal aos 17 anos, rumo ao Brasil, como muitos na altura. Aí passou 18 anos da sua vida. No entretanto, acumulou experiências únicas, aventuras incríveis como só alguém que teve um bar durante o Carnaval do Rio pode saber. Foi dono de uma farmácia, onde ganhou alguns conhecimentos sobre saúde. Investiu e ganhou, investiu e perdeu, sempre com determinação.

Ao fim desse tempo, e sentindo os tempos de crise no Brasil, volta a Portugal, onde conhece a esposa e emigra uma vez mais, desta feita para os EUA. É neste país que se estabelece finalmente, desta vez como homem de família. No peito, uma enorme saudade pela família e pela sua terra. Longe vão as aventuras em terras brasileiras. Nos EUA ficará para sempre reconhecido como um excelente profissional, ao qual lhe imploraram que continuasse a trabalhar quando atingiu a idade da reforma. Mesmo depois da primeira vitória sobre o cancro, com a remoção de metade de um pulmão, não parou de trabalhar.

Foi graças a ele que eu tive o meu primeiro walkman em 1986, quando tal ainda se desconhecia por estas bandas. Foi graças às conversas dele que eu comecei a perceber um pouco sobre política, economia e culturas estrangeiras, sobre interesses, sobre Bretton-Woods e negócios internacionais. Foi graças a ele, 10 anos mais velho que o meu pai, que eu percebi de onde vinha o hábito familiar de estar sempre a contar piadas e de gozar com tudo e todos.

Lembro-me de uma vez, com 12 anos, em que estava a olhar para uma rapariga, na cidade de onde ele é oriundo. Era notório que eu estava interessado e (digo-o agora, na altura não o sabia) era notório que ela também estava. Contudo, eu estava bloqueado por aqueles inibidores naturais potentíssimo: a parvoíce e o medo. Acho que, na minha cabeça, esperava que alguma intervenção divina criasse uma situação de contacto. O meu padrinho, apercebendo-se desta situação, decidiu que era altura de uma conversa frontal.

Com o seu olhar malandro, de quem já viu e viveu muito, diz-me ao ouvido: “Estás à espera que ela te caia em cima? O teu avô sempre disse que só nos arrependemos dos riscos que não corremos. Vai lá! Se correr mal, nós vamos te gozar, vamos te xingar (ele nunca perdeu certas expressões brasileiras), mas tu vais saber que tentaste. Lembra-te que mais vale falhar que não tentar.”

Outros episódios se poderiam contar, outras vezes em que ele, mesmo a 7.000 kms de distância, conseguiu estar presente. Peripécias dos seus 18 anos de solteiro no Brasil, com ladrões, espertalhões, aventureiras, donzelas apaixonadas, bêbados do Carnaval, extorsionistas e outros. Ou de como sempre tentou conciliar tudo e todos, pois não suportava a ideia de uma família dividida. Ou ainda de como, um a um, foi chamando todos os irmãos para o pé de si.

Poderia falar da luta titânica que travou nos últimos tempos, contra o gigante que não lhe deu tréguas, que o obrigou a encontrar forças onde ele não sabia que tinha.

 

E posso recordar a luta contra si mesmo, quando, 15 minutos após eu lhe ter ligado e ter tido uma conversa em que ele estava mais “alheio”, ele me telefona e me diz: “Há pouco eu não estava bem, vamos conversar agora…”. O resto, não vos interessa.

 

Obrigado Padrinho, por tudo, incluindo este último telefonema que fizeste! Obrigado por teres mostrado como se luta contra tudo e todos, apesar de tudo o que a vida possa lançar contra nós! Obrigado por teres sido sempre a personificação das palavras do avô, e por me incitares a arriscar sempre! E obrigado por não permitires que a nossa última conversa fosse menos do que perfeita, por até às portas da morte e ultrapassando o limiar humano da resistência à dor, teres encontrado a força para manter a lucidez, a razão e o carinho!

 

Adeus!

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Desabafo

Uma das coisas mais tristes que conheço é estar doente sozinho. Ali estamos nós, num dos momentos de maior fragilidade, em que nos sentimos particularmente vulneráveis e não temos ninguém connosco que mitigue esse sentimento.

Sou, e sempre fui, um defensor da máxima “mais vale só que mal acompanhado”. Mas quase vale a pena abrir uma excepção para os casos em que se está doente…

Admito-o! Sou um doente mimalho. E não gosto mesmo nada de estar doente sozinho!

 

Ah, e bom 2009 para todos.