“Não.”
Ela recusava-se a ouvir o som que os ouvidos lhe transmitiam.
Havia vestido umas calças de cintura descaída, aparentemente largas, mas que lhe desenhavam muito bem as formas por baixo. Um top cai-cai, já que se podia dar a esse luxo, revelava pele morena e uma barriga lisa. A maquilhagem também estava bem desenhada, com linhas negras rodeadas de um sombreado verde-azeitona a prolongar-lhe o formato dos olhos, e um batom que lhe escurecia o tom dos lábios finos, ao mesmo tempo que lhes aumentava o brilho.
Tinha chegado mais do que elegantemente atrasada, com um sorriso e um beijo para todos os que conhecia. Um Gin Tónico depois, dirigiu-se para o centro da pista, onde ele já se encontrava. Iniciou a sua dança feita de movimentos europeus misturados com angolanos, sem nunca nele pousar os olhos. Ela sabia o quão provocante a indiferença pode ser, se em doses controladas. Contudo, todos os seus movimentos, apesar de não o parecer, a ele estavam dirigidos. Não por qualquer motivo romântico. Nem mesmo uma atracção sexual, se bem que sexo estivesse nos planos. Apenas queria que ele a quisesse sexualmente, tal como havia querido outros noutras noites e outros quereria depois.
Prática e um dom pessoal, talvez o de uma personalidade assim construída, haviam-na dotado de imensa perícia nos movimentos e ondulações, nos olhares indiferentes enquanto as ancas provocam, no virar de costas enquanto o rabo convida, nos olhares fechados enquanto a pélvis balança e o rosto se ilumina de prazer pseudo-antecipado.
Quando o DJ muda para Kizomba, ele convida-a, tal como espera. E, tal como já tinha observado, ele era bom. Havia praticado. Uma braço quase enlaçado nas suas costas, a mão descendo ao fundo das costas e além. A outra mão no ombro, os dedos perto do pescoço. Ela agarra o meio das suas costas enquanto lhe puxa a cabeça pela nuca até ao pescoço.
Há quem pense que Kizomba é masculino. Na verdade, é um veículo bem feminino de sedução e expressão da sensualidade e sexualidade feminina. Ele conhece bem o seu papel. Sempre colados, vai-lhe dando o espaço para a sua dança. Guia-a em passos de 2 por dois, que mudam para 1 por dois, para um por um, e para 2 por 2 outra vez… Nos intervalos, as pausas, em que apenas ela se mexe, as ancas rebolando e a pélvis provocando-o constantemente. É um ritmo quente. Tal como ela.
Sabem que estão a ser observados. olhares de cobiça e inveja, alguns de desdém. Ele não se importa. Ela vibra com isso. Continuam por mais 5 músicas, os seus corpos já transpirados devido ao calor da sala, das luzes, e dos seus corpos sempre colados.
Por fim, ele afasta-se. Trocam sorrisos e ele vira costas para uma bebida. Ela dança sozinha mais um pouco. Vai ter com ele ao bar e pergunta-lhe: “Vamos a minha casa?”
“Não” é a resposta que continua sem querer ouvir.